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Seletividade no Judiciário | Para Sergio Moro, Beto Richa vem ao caso?

26 de junho de 2018

Moro abre mão de processo que atinge ex-governador, enquanto STJ manda juiz de Curitiba enviar investigação contra tucano para Justiça Eleitoral

O juiz declara-se assoberbado | Foto por Lula Marques/Agência PT

Após quatro meses de silêncio, Sergio Moro contrariou a impressão geral de ser o único magistrado habilitado no Brasil a julgar casos de corrupção e abriu mão de um processo ligado à Lava Jato. Alegou excesso de trabalho, embora, ao contrário da maioria dos inquéritos que o assoberbam, o crime tenha sido cometido em seu estado de origem, o Paraná (não seria ele o juiz natural?).

A investigação atinge em cheio o ex-governador Beto Richa, do PSDB, cujos filiados costumam aparecer sorridentes em fotos ao lado de Moro.

A Operação Integração aconteceu em fevereiro e marcou a 48ª fase da Lava Jato. A Polícia Federal cumpriu sete mandados de prisão preventiva. Entre os detidos e acusados aparecem o ex-diretor-geral do Departamento de Estradas e Rodagens do Paraná Nelson Leal Junior, homem de confiança de Pepe Richa, secretário de Infraestrutura e Logística e irmão do ex-governador, e Carlos Nasser, assessor da Casa Civil.

O esquema desviou, de acordo com os investigadores, ao menos 65 milhões de reais somente nas negociatas com a Econorte, administradora de cinco rodovias estaduais. A propina era paga em troca da autorização de reajustes abusivos dos pedágios.

Além do superfaturamento, em alguns itens da planilha de custos o sobrepreço atingiu 89% em relação ao valor de mercado. Toda essa gordura teria sido desviada para os subornos.

Nesta segunda-feira, 25, outro movimento da Justiça tirou Richa das mãos de Moro. O Superior Tribunal de Justiça mandou o juiz de Curitba remeter à Justiça Eleitoral uma investigação contra o ex-governador por susposto recebimento de caixa dois da Odebrecht, ao considerar que o caso do tucano não envolve corrupção.

Moro encaminhou o inquérito, mas buscou demonstrar contrariedade. “Não se trata de mero caixa dois de campanha”, afirmou o magistrado. Segundo o juiz, há indícios de contrapartidas à vantagem financeira. Ao enviar os autos, ele pediu que sejam posteriormente devolvidos para a continuação das investigações de corrupção, lavagem e fraude à licitação.

À época da Operação Integração, ao acatar os pedidos de prisão, Moro afirmou que havia “em cognição sumária, provas de crimes de corrupção, de lavagem de dinheiro e de associação criminosa” em “fundada suspeita de que o grupo empresarial teria utilizado uma rede de empresas de fachada para simular despesas contábeis e para realizar pagamentos em favor próprio ou de seus familiares”. 

Os operadores do esquema seriam o advogado Roberto Tacla Duran e o doleiro Adir Assad, alvos da Lava Jato.

O grupo, aponta o Ministério Público, usava o mesmo esquema de propinas investigado na Petrobras, inclusive “os mesmos operadores financeiros”. A ação teria como objetivo “a apuração, dentre outros, dos crimes de corrupção, fraude a licitações e lavagem de ativos”.

Morou abriu mão do inquérito quatro dias antes de Leal Junior fechar um acordo de delação premiada. No termo 25 do acordo, o único oficialmente tornado público pela Justiça, o ex-diretor do DER confessa a existência da organização criminosa e admite que a acusação de lavagem de dinheiro é verdadeira.

Insinua ainda que outros contratos, além das rodovias da Econorte, poderiam ter rendido propinas, uma vez que “a organização atuava também com as concessionárias de pedágio”.

Em outra declaração, no item 27, divulgada pela mídia, mas não confirmada pela Justiça Federal, Leal Junior teria afirmado que, após sua prisão, o empresário Elias Abdo, amigo de Richa, teria sugerido à sua esposa que ele não trocasse de advogado nem fechasse um acordo com os investigadores. Teria ainda dado um recado de que Pepe Richa gostaria de conversar para demovê-lo da ideia. Abdo e Pepe negam.

Segundo o advogado criminalista Leonardo Zorzi, a contradição de Moro está em seus próprios despachos. Quando recebeu o processo oriundo da Vara Federal de Jacarezinho, no Paraná, comarca onde está sediada a Econorte, o magistrado não só concordou com o posicionamento como afirmou que sua competência não estava restrita a casos ligados à Petrobras.

A argumentação sinuosa encontra-se neste trecho do despacho que o levou a aceitar o processo: “É certo que atualmente o cerne da Operação Lava Jato consiste na apuração do pagamento sistemático de vantagem indevida em contratos da Petrobras, o que não é o caso aqui (…) Ilustrativamente, no âmbito da Operação Lava Jato, já foi inclusive julgado crime de tráfico internacional de drogas e a lavagem subsequente do produto, o que não está relacionado diretamente aos crimes no âmbito da Petrobras. Portanto, não se confundindo a Operação Lava Jato unicamente com acertos da corrupção em contratos da Petrobras…”

Quatro meses mais tarde, ao rejeitar o inquérito, o magistrado contrariou a própria alegação anterior. “É correto afirmar”, anota, “que a ação penal não tem objeto acertos de corrupção em contratos da Petrobras, o que, juntamente com as posteriores revelações e crimes praticados no âmbito do Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, constitui o cerne da Operação Lava Jato, sendo também razoável o entendimento de que a separação dos processos não geraria grandes dificuldades para o processo e julgamento, já que as provas podem ser compartilhadas entre as Varas Criminais Federais de Curitiba”.

 

Por René Ruschel

Fonte: Carta Capital