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Reforma do ensino médio como primeira pauta no senado

6 de fevereiro de 2017

Por Rogério de Souza Silva, especial para os Jornalistas Livres

Findado o teatro mal ensaiado das eleições para as presidências das casas legislativas no Congresso Nacional, a primeira pauta de votação no Senado será a desastrosa reforma do Ensino Médio que está agendada para terça-feira, 07, com a exposição dos senadores ressaltando os prós e contras da proposta do Ministério da Educação (MEC).

Enviada para o Congresso em 22 de setembro de 2016 na forma de Medida Provisória, a MP 746/2016 propõe uma reviravolta na escola secundária brasileira. Desde a sua edição, a proposta causou arrepio na comunidade escolar devido à insistência do governo Temer em modificar o Ensino Médio do país recorrendo ao instrumento impopular e autoritário de Medida Provisória. Ou seja, alegando urgência, não pratica diálogo com aqueles que mais serão afetados: estudantes, educadores e pais. Pensa a educação como imposição e não como um processo que exige muito estudo e diálogo para ser transformada. A quem essa pressa realmente interessa?

A proposta do MEC aciona palavras bem aceitas na modernidade líquida: flexibilidade e livre escolha. Naquilo que vem sendo chamado de o “Novo Ensino Médio”, os estudantes não cursariam as mesmas disciplinas (formação básica comum) e, após alguns semestres na escola secundária, optariam por um dos itinerários formativos sugestionados pela MP: Linguagem, Matemática, Ciências Humanas, Ciências da Natureza ou Formação Profissionalizante (cursos técnicos). Assim, afirma o planalto, os educandos não perderiam tempo no aprofundamento de conteúdos de disciplinas que não despertariam o seu interesse e dedicação.

No entanto, o governo Temer não problematizou a questão. Escolas de inúmeros municípios brasileiros não apresentam estrutura física e profissionais suficientes para ofertar as 5 trilhas formativas. Dessa forma, muitos estabelecimentos de ensino apresentarão, caso a reforma seja aprovada, somente um ou dois itinerários, obrigando o secundarista a migrar para outra instituição ou contentar-se com aquele itinerário que for oferecido. É um verdadeiro Ovo de Colombo. Além disso, dos mais de 5.500 municípios, 3.800 possuem uma única escola de nível médio e o governo Temer não apresentou, até o momento, a fonte do recurso necessário para a reestruturação dessas instituições de ensino. Na realidade, a festejada flexibilidade tornar-se-á, na prática, encaminhamento forçado para uma formação limitada.

A MP também trata da diminuição de disciplinas (exclusão de Artes, Educação Física, Filosofia e Sociologia), contratação de profissionais do magistério sem formação pedagógica (notório saber), aproveitamento de créditos e saberes adquiridos em cursos avulsos e/ou organizações empresarias e a expansão da escola em tempo integral (de 800 horas/ano para 1.400 horas/ano). Mais uma vez, Temer não menciona de onde sairá a verba para custear essas modificações.

Na realidade, o texto encaminhado pelo MEC reedita tentativa mal sucedida de reformar o Ensino Médio na década de 1990, período em que o ideário neoliberal reinava empunhando o estandarte tucano. Escola pública de qualidade não está no horizonte da MP. Da maneira como foi apresentado, o texto beneficiará o setor privado e aprofundará a mercantilização da educação. Em outras palavras, como muitos municípios não terão condições para ofertar os 5 itinerários formativos, instituições particulares se prontificarão para suprir a “carência” do Estado brasileiro. A velha lógica de criar dificuldades para vender facilidades.

Editado como Medida Provisória, o texto precisa ser votado até o início de março deste ano. Dessa maneira, formou-se da noite para o dia uma comissão para discutir a proposta e, num período recorde, diversos estudiosos do tema, associações profissionais e intelectuais tangenciaram o texto criando um falso sentimento que o assunto foi debatido de forma democrática e exaustiva.

Protesto dos estudantes secundaristas em São Paulo contra a MP da Reforma do Ensino Médio em 2016. Foto: Tuane Fernandes

No final dos trabalhos da comissão, o relator apresentou parecer (34/2016) que pouco alterava o texto original, com exceção para o retorno dos componentes curriculares de Artes e Educação Física. As disciplinas de Filosofia e Sociologia caíram em um limbo que nos impende de determinar o retorno e obrigatoriedade das mesmas – espera-se que a votação no Senado esclareça este ponto.

No apagar das luzes de 2016, a questão envolvendo o Ensino Médio acentuou-se e o imbróglio começou a ser desvelado. O Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot emitiu, no dia 19, parecer contrário à Medida Provisória 746/2016. O parecer da PGR aponta a inconstitucionalidade da proposta do governo – especialmente no que diz respeito a urgência e relevância -, e desconstrói os questionáveis argumentos para justificar a celeridade e a adoção de uma MP para modificar a Educação brasileira.

Para pulverizar as alegações do ministro da educação Mendonça Filho e Cia., Janot assinala as contradições do documento. “Não parece aceitável nem compatível com os princípios constitucionais da finalidade, da eficiência e até da razoabilidade que tal matéria, de forma abrupta, passe a ser objeto de normas contidas em medida provisória, que atropelam do dia para a noite esse esforço técnico e gerencial do próprio MEC, em diálogo com numerosos especialistas e com a comunidade, ao longo de anos”.

Janot também argumenta que, “por seu próprio rito abreviado, [a MP] não é instrumento adequado para reformas estruturais em políticas públicas, menos ainda em esfera crucial para o desenvolvimento do país, como é a educação”.

O parecer de Janot faz parte de análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 5.599, proposta pelo PSOL. Segundo o partido, a MP viola os pressupostos exigidos pela Constituição para edição de medidas provisórias.

Diante de incertezas pedagógicas, financeiras e jurídicas, espera-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) jugue a MP do Ensino Médio inconstitucional e provoque um amplo debate na sociedade que enfatize, realmente, as escolhas dos secundaristas e a qualidade de ensino da escola pública. Para que isso ocorra, a mobilização de educadores, estudantes, pais e demais simpatizantes é de suma importância.