Reescrevendo o passado | Edição feita por computador da PM de SP suaviza ditadura na Wikipédia
Modificação em artigo sobre AI-5 feita na última sexta (21) substituiu termos como ‘ditadura’ e ‘tortura’ por ‘regime’ e ‘práticas de extração de informação’
Um computador vinculado à Polícia Militar do Estado de São Paulo foi utilizado, na última sexta-feira (21), para fazer uma série de alterações no artigo sobre o AI-5 (Ato Institucional Número Cinco) na Wikipédia, amenizando o período de ditadura militar no Brasil.
A informação da Wikipédia é que o usuário responsável pelas alterações é ligado à Prodesp (Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo).
Um levantamento feito pelo R7 mostra que o endereço de IP (espécie de identificação de cada computador na internet) responsável pela alteração é utilizado pela rede de computadores da Polícia Militar (veja a imagem abaixo).
Procurada pela reportagem, a Prodesp disse que “administra a rede de comunicação de dados do Governo do Estado de São Paulo, com milhares de links utilizados por diferentes órgãos públicos”.
Após a publicação da reportagem, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) confirmou ao R7 que a edição partiu de um dos computadores da Polícia Militar.
IP que fez alterações sobre a ditadura militar no site Wikipédia é vinculado à PM
A edição do artigo substituiu “ditadura”, “tortura” e “golpe de estado” por “regime”, “práticas de extração de informação” e “revolução”, respectivamente.
A mudança ainda omitiu, por exemplo, que os parlamentares “contrários aos militares” perderam os mandatos e acrescentou que o AI-5 suspendeu garantias constitucionais que “pudessem contribuir eventualmente para o regime comunista”.
As alterações feitas no site foram revertidas por outro usuário cerca de 30 minutos depois.
Wikipédia indica que IP utilizado pela PM é atribuído à Prodesp
Para o presidente da SaferNet, Thiago Tavares, que atua em defesa dos direitos humanos na internet, o autor das alterações pode sofrer penalizações administrativas, por ter “um desvio ético em tentar minimizar os crimes que foram praticados no período de exceção”.
Segundo o presidente da SaferNet, esse tipo de rede corporativa não tem o acesso público. “Pelo contrário, para ter acesso precisa de uma senha, um login, um cadastramento prévio”, diz. Isso significa que o processo para chegar até o responsável pela modificação seria facilitado.
Outro lado
Procurada pelo R7, a assessoria de imprensa da SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) disse que “o responsável pela edição já foi identificado e um processo administrativo instaurado para a adoção das medidas disciplinares cabíveis”.
A pasta ainda disse que “o ato não teve qualquer apoio ou orientação da Corporação, que esclarece que o uso dos equipamentos da instituição é restrito à atividade policial”.
Veja as alterações
Por Kaique Dalapola e Márcio Neves
Fonte: R7