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Natalia Szemerta: Sozinhas temos medo, unidas venceremos!

8 de março de 2018

Fonte: Mídia Ninja

Por Natalia Szemerta, coordenadora nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da Frente Povo Sem Medo

“Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.” – Rosa Luxemburgo

Foto por Mídia Ninja


O medo ronda nosso país. Nós, mulheres pobres, indígenas, periféricas, do campo, onde quer que estejamos, enfrentamos a violência do Estado, a violência cultural desta sociedade machista, racista e sexista, a violência da Casa Grande e do agronegócio; lutamos também contra nossos medos!

Há de se aproveitar este mês de março para refletir sobre esta poderosa ferramenta de dominação dos povos, dominação esta que se impõe pela força, pela covardia, pelo extermínio.

Aquelas bravas mulheres tecelãs queimadas na fábrica são exemplo de como a sociedade patriarcal pela força se mantém.

As mulheres indígenas, que tiveram seus corpos violentados, seus filhos e maridos assassinados, que são desprotegidas e invisibilizadas, são exemplos de como esta sociedade desigual se estrutura.

As mulheres afrodescendentes, que tiveram seus corpos vendidos e chicoteados, sua sexualidade precificada e suas famílias destruídas, são exemplos de como uma sociedade racista e violenta se mantém.

As mulheres periféricas, que têm suas casas invadidas pela polícia e pelo exército, que têm seus filhos encarcerados ou assassinados, que têm seus direitos negados, são exemplos de como se sustenta um país injusto.

As mulheres que recebem menos que homens, mesmo quando desempenham a mesma função, as mulheres que são impedidas de amamentar e de ver seus filhos crescerem, para criar os filhos da casa grande, são exemplos de como se perpetua no poder 1% de privilegiados massacrando 99%.

São todas essas mulheres exemplos vivos de que não será possível uma mudança real em nossas vidas sem enfrentar a estrutura que sustenta o patriarcado, sem mexer nas feridas ainda abertas desta Latinoamérica, sem reconhecer que a desigualdade brasileira também se sustenta nas desigualdades raciais, de gênero e sexuais.

Estamos diante de paradigmas novos, que exigem reflexões sobre nossas práticas, que exigem pensamento diverso e acolhimento, que exigem nos unirmos pela esperança de um mundo melhor, pela potência das nossas lutas e não somente pelas desgraças deste mundo.

Não queremos um feminismo quadrado, estereotipado, rancoroso, que se limita a debates de autoafirmação e estímulo à disputa e ao ódio contra homens.

Queremos um feminismo popular, acolhedor, que reconheça a diversidade entre nós mulheres, que seja generoso, que abra espaço a todas e que não seja reprodutor das práticas machistas da velha política: sectário, agressivo e que acaba transformando todo pensamento divergente em disputa de poder.

Queremos um feminismo que aceite nosso medo, nosso choro, que reflita sobre nossa culpa e nossos traumas, que considere a complexidade da subjetividade humana, que seja afetuoso. Um feminismo que não nos defenda apenas por sermos mulheres, mas sim um feminismo que defenda a vítima e ao mesmo tempo reconheça as contradições da sociedade, um feminismo que não tenha o homem como ponto de partida da sua crítica e inimigo interno, e sim o patriarcado!

Um feminismo que não tenha uma defesa incondicional e cega de todas as mulheres, porque, sim, existem mulheres escrotas que oprimem ou exploram outras mulheres e que não querem abrir mão de seus privilégios, ou sequer querem reconhecê-los!

Um feminismo que tenha a clareza de que direitos são conquistas a serem preservadas, e saiba os diferenciar dos privilégios. Um feminismo que seja arejado, que não entre nas disputas fratricidas de quem é a mais “desgraçada”. Que tenha a clareza do papel a cumprir em uma sociedade que se organiza pela força e pelo medo.

Um feminismo que tenha a coragem de assumir que, sim, sozinhas temos medos, e que todas nós somos violentadas por este sistema; quando sozinhas temos medos.

Mas que juntas conseguimos ultrapassar esta barreira e que não faremos mudanças reias e coletivas na sociedade disputando, exterminando ou ignorando homens, e sim convencendo todos e todas de que unidas e unidos podemos mudar, podemos vencer nossos medos. Podemos vencer os que nos causam medo e nos reconstruir humanamente.

Viva às mulheres guerreiras da América Latina!