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Artigo | Do lado de Lula sem hesitação e por outros motivos, Guilherme Boulos tem um futuro

4 de julho de 2018

A história: Na frente comum que hoje defende o ex-presidente Lula destaca-se a figura de Guilherme Boulos, aos 36 anos o líder do MTST e pré-candidato à presidência do PSOL

Guilherme Boulos no palco com Lula e Manuela d’Ávila do PC do B | Foto por Amina Jorge

Há pouco mais de dois meses, quando o ex-presidente Lula fez seu último discurso antes de se apresentar espontaneamente à polícia, estavam presentes outros dois pré-candidatos à próxima eleição presidencial: Manuela D’Ávila do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) e Guilherme Boulos, coordenador nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e pré-candidato pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade).

Sua participação no palco foi significativa porque sinalizou a presença de uma ampla frente em solidariedade ao ex-presidente. A prisão de Lula representa para a esquerda brasileira um duríssimo golpe e é considerada por muitos a última fase do golpe parlamentar cometido pelas elites contra o projeto progressista representado pelos governos do PT (Partido dos Trabalhadores).

“Boulos é um companheiro da mais alta qualidade. Você tem um futuro, meu irmão”, Luiz Inácio Lula da Silva

A prisão de Lula muito provavelmente prejudicará sua possibilidade de concorrer às eleições. Apesar disso, por enquanto, o ex-presidente parece não querer ceder; e enquanto ele continua a ser o pré-candidato oficial do PT, o partido está vivendo uma crise dramática. Mas se Lula jamais tivesse que se retirar e endossar publicamente outros candidatos, provavelmente faria opção por Boulos.

O coordenador do MTST formou-se na luta dos movimentos sociais pela moradia, e sua trajetória política lembra dos primeiros anos de Lula, quando o mesmo foi o líder do Sindicato dos Metalúrgicos na periferia industrial de São Paulo.

Inclusive graças a esta afinidade comum com as classes populares, em seu último discurso, o ex-presidente dirigiu palavras afetuosas a Boulos:

“Um companheiro da mas alta qualidade. Você tem um futuro, meu irmão”

Embora o MTST tenha frequentemente dispensado fortes críticas aos governos Lula e Dilma, em um momento como este, de grave crise para a democracia brasileira, o movimento escolheu sem hesitação de que lado ficar. Foram seus militantes que protegeram Lula na sede do Sindicato dos Metalúrgicos antes que ele se apresentasse à Polícia Federal, e foi novamente o MTST que ocupou simbolicamente o apartamento tríplex que, segundo a acusação contra o ex-presidente, foi objeto de troca de favores com uma grande construtora.

“Se é do Lula, então é nosso!”, gritavam os militantes durante a breve ocupação

Recentemente, Boulos foi convocado pela Polícia Federal para dar esclarecimentos sobre essa ação: um sinal evidente do agravamento do clima político.

Foto por Amina Jorge

“Guilherme se tornou o pré-candidato do PSOL porque conseguiu interpretar corretamente a fase política atual e levar o pessoal para a rua”, um militante do MTST

Boulos, 36 anos, que recentemente obteve seu mestrado com uma dissertação sobre os efeitos positivos que as ocupações suscitam em pessoas com sinais de depressão, tornou-se o pré-candidato do PSOL apesar de alguma “dor de estômago”. O partido nasceu em 2004 após a expulsão de alguns parlamentares “críticos” do PT e é uma força relativamente pequena, mas de numerosas correntes. O desafio para Boulos é conseguir fazer crescer o partido do mesmo modo como transformou o MTST e o fez chegar a ser um movimento de porte nacional.

Um militante explica: “Guilherme tornou-se o pré-candidato do PSOL porque conseguiu interpretar corretamente a fase política atual e levar o pessoal para a rua. Já em junho de 2013 [quando o país presenciou uma onda de manifestações populares contra os altos preços do transporte público], Guilherme entendeu que era preciso sair nas ruas, mas ao mesmo tempo criticou fortemente os componentes da direita daquele momento” [que a seguir contribuíram para as mobilizações contra o governo Dilma – nota da redação].

Quase um mês atrás, no auge dos protestos dos caminhoneiros e dos petroleiros que pôs o país de joelhos, Boulos participou de uma grande manifestação em São Paulo, em solidariedade com a greve e contra o uso do exército que havia sido autorizado pelo presidente Temer.

A grande maioria das pessoas nessa manifestação foram militantes do MTST, vindos diretamente das várias ocupações na periferia da cidade. Um grupo enorme carregava com orgulho a grande faixa da Ocupação Marielle Vive, a recente ocupação dedicada à memória de Marielle Franco. Hoje, após dois meses, a Marielle Vive se consolidou e, ao lado de cine-debates e aulas de capoeira, começaram atividades de formação política e jurídica para as pessoas acampadas.

No grande barracão de madeira prensada, logo perto da entrada, acontece uma reunião para os coordenadores dos grupos – as cerca de três mil famílias acampadas estão divididas em dez grupos, cada qual com seu banheiro e sua cozinha coletiva. Um militante do setor de formação política começa o encontro perguntando aos participantes: “Na opinião de vocês, o movimento está totalmente contra o conceito de propriedade?”. Ele continua com um exemplo para ilustrar o raciocínio: “Tomamos como exemplo que alguém quer acumular um número enorme de escovas de dente. Vocês são contra isso? Ou seja, isso prejudicaria a possibilidade de vocês de ir ao supermercado e comprar uma?”.

O ponto é que a situação da terra é diferente – não pode ser reproduzida como qualquer bem de consumo: “Então, como ficam os grandes proprietários que acumulam terras e depois as deixam abandonadas?”

A formação continua com a leitura coletiva de alguns artigos da Constituição, aqueles que falam da função social que a propriedade privada deve ter. “Tenho certeza de que muitos de vocês já ouviram que são vagabundos, que estão violando a lei. Mas quando pensamos bem – quem está desrespeitando a lei, nós que lutamos pelo nosso direito à moradia ou o proprietário que está especulando com este terreno há mais de 50 anos?”.

Embora os direitos sociais sejam garantidos pela Constituição, as classes populares brasileiras vivem em condições de grave dificuldade econômica. O governo Temer está impondo medidas de austeridade, e o desemprego aumenta.

Durante o encontro, o militante do movimento pergunta aos coordenadores quem está desempregado, e quase todas as mãos se levantam. Depois, para mostrar que a situação dos pobres não está melhor, apesar do crescimento do PIB, pergunta quem estava desempregado em 2012 (durante o primeiro governo Dilma): se levantam somente duas mãos.

 

 

Por Alberto Fierro | Tradução por Monika Ottermann

Fonte: Il Manifesto (Itália)