A nova direita montou uma ofensiva contra ação do Facebook para combater fake news
Tática de movimentos como MBL e Nas Ruas é acusar as agências de checagem de informação de estarem repletas de jornalistas de “extrema-esquerda”. Empresa diz que combate a notícias falsas atinge todos os partidos.
Imagem por Lionel Bonaventure/ AFP/ Getty Images
Com Dilma longe do Planalto e Lula preso em Curitiba, movimentos da nova direita que ganharam protagonismo político nos protestos anti-PT de 2015 e 2016 têm agora um novo antagonista: as agências de checagem de informação parceiras do Facebook para identificar fake news.
Desde segunda-feira, as agências Lupa e Aos Fatos têm acesso a dados do Facebook relacionados a conteúdo potencialmente falso que está viralizando na plataforma, usada por 102 milhões de pessoas do país.
Após a checagem destas agências, posts classificados como fake news terão seu alcance orgânico severamente reduzido e não poderão ser impulsionadas por meio de pagamento ao Facebook. Na prática, tais conteúdos chegarão a um número menor de pessoas. Quem quiser compartilhá-los receberá um alerta de que a veracidade foi questionada.
Grupos como o Nas Ruas, Revoltados Online, MBL e expoentes da direita nas redes sociais, como Rodrigo Constantino e Joice Hasselmann, entre outros, consideram que o programa de verificação de informações embute, na verdade, uma tentativa de censura do Facebook à manifestação de ideias de direita em pleno ano eleitoral.
Já acusados de espalhar notícias falsas sobre adversários políticos, esses grupos produziram um catatau de 300 páginas em que afirmam ter “checado os checadores”, com base em postagens de jornalistas das agências de checagem em seus perfis pessoais em redes sociais.
Com base em posts e até em retuítes de suas contas pessoais, os jornalistas são classificados como “esquerda”, “extrema esquerda” ou — quando não é encontrado nenhum indicativo de preferência ideológica — “indefinidos”. Além de Aos Fatos e Lupa, também são listados profissionais que trabalham para a Agência Pública.
O dossiê não chega a cravar que eles são filiados a partidos políticos. A tática de expor perfis pessoais dos jornalistas foi classificada pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) de “ataque virtual”.
Não surpreende que os criadores de “fake news”, outrora chamadas de mentiras, estejam promovendo agressões contra profissionais sérios que trabalham, justamente, para checar fatos e expor o banditismo praticado por essa gente na web https://t.co/PtKrWSMI2J
— Ricardo Setti (@ricardosetti) 17 de maio de 2018
“Basta olhar quem são os checadores: não há ninguém de direita ou de centro-direita. Nós já tivemos conteúdo que não possuía nenhuma informação falsa considerado fake news somente por questões ideológicas“, disse Kim Kataguiri, pré-candidato a deputado federal pelo DEM e líder do MBL.
“Isso não pode acontecer, ainda mais num ano eleitoral”, afirmou.
Junto de representantes do agronegócio, evangélicos e policiais, estes grupos de direita pretendem ingressar com ações na Justiça contra a nova política do Facebook e acreditam que, por meio da mobilização de internautas, serão capazes de fazer a plataforma voltar atrás em sua decisão de limitar a divulgação de conteúdos considerados fake news. Nada indica, no entanto, que isso pode funcionar.
O plano de Mark Zuckerberg de verificar a circulação de informação falsa é uma iniciativa global, uma tentativa de responder às crescentes críticas sobre o papel do Facebook após a revelação de que a Cambridge Analytica, firma de consultoria que prestou serviços às campanhas de Donald Trump nos EUA e do Brexit no Reino Unido, pode ter tido acesso aos dados de mais de 87 milhões de pessoas.
De certa maneira, a reação da direita brasileira mimetiza a reação de grupos conservadores americanos diante da nova política de checagem do Facebook. Lá, estes ativistas da chamada Alt-right (direita alternativa, em tradução livre) também acusaram a plataforma de usar as fake news como pretexto para censurá-los.
Combater notícia falsa não é censura, diz Facebook
Tanto o Facebook quanto as agências envolvidas na checagem de fatos, Aos Fatos e Lupa, dizem que as alegações de censura não fazem sentido.
O Facebook afirma que o objetivo da nova ferramenta de checagem não passa por critérios ideológicos e se limita a verificar quando fatos estão incorretos. Em conversas reservadas, integrantes do Facebook gostam de citar como exemplo a popularidade alcançada pela informação falsa do casamento entre Marielle Franco e o traficante Marcinho VP, nos dias seguintes ao assassinato da vereadora do PSol no Rio.
Antes de ser desmentida, a cascata circulou livremente por vários grupos e comunidades da rede social. É exatamente este tipo de situação que o Facebook visa coibir.