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Juristas avaliam | Se continuar agredindo movimentos depois de empossado, Bolsonaro cometerá crime

31 de outubro de 2018

Segundo juristas, manutenção do discurso de ódio contra organizações pode configurar crime de responsabilidade

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra existe desde 1984 e organiza mais de dois milhões de camponeses em todo o Brasil | Foto por Luiz Fernando/MST

“O jogo não está dado”, afirma a jurista e professora da Universidade de Brasília, Beatriz Vargas, sobre as promessas do presidente eleito Jair Bolsonaro de caracterizar movimentos sociais como “organizações terroristas”. Para ela, com essa postura, o presidente terá que lidar com o texto constitucional, que reconhece o livre direito de organização e manifestação política.

A “Criminalização das lutas sociais” foi tema de debate realizado nesta terça-feira (30) pelo o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), em São Paulo. Além de Vargas, participou do debate o Padre Júlio Lancelotti, sacerdote católico e membro da Pastoral do Povo da Rua, com mediação de Ney Strozake, advogado e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).

Vargas destacou o marco temporal dos 30 anos de vigência da Constituição de 1988 que, segundo ela, foi construída em um ambiente de consenso sobre o exercício do Judiciário como garantista dos direitos sociais. “De uns tempos para cá, o que observamos é uma mudança em relação ao senso técnico jurídico do campo e uma atitude de má vontade com as ações e os movimentos sociais”, ponderou.

Segundo a jurista, o discurso de Bolsonaro, embora acenda o alerta sobre a criminalização das lutas sociais, deverá ser atenuado após sua diplomação como presidente; caso contrário, Bolsonaro estaria praticando crime de responsabilidade.

“O candidato vitorioso vem com um discurso punitivista, agressivo, e faz ameaças de que vai agir no sentido de colocar fim ao ativismo social, e isso nos coloca uma série de preocupações. Essas preocupações hoje são reais e não devem ser subestimadas. E por outro lado, é bom também a gente ter em mente que não podemos superestimar. A fala do candidato não pode ser a fala do presidente. Ou seja, uma vez empossado presidente da República, o capitão Bolsonaro, se continua realizando esse tipo de ativismo, ele estaria praticando crime de responsabilidade. A Constituição em vigor não é só a origem desses movimentos sociais, como protege a sua atuação”.

Vargas chamou a atenção para o decreto presidencial 9.527, de 15 de outubro de 2018, que cria uma força tarefa especial de inteligência, com o objetivo de fornecer elementos de análise e acompanhamento de organizações criminosas ou terroristas. Segundo ela, não é a existência do decreto em si que causa apreensão dos defensores de direitos civis e políticos, mas a modificação da legislação que delimita o que é organização criminosa ou terrorista, através de projetos de lei que já tramitam no Congresso.

“É preciso acompanhar e monitorar esse movimento, como uma forte não só prevenção, mas de tentar impedir que esse movimento ocorra”.

Dois dias depois da eleição presidencial, o Padre Júlio Lancelotti fez uma provocação sobre o sistema político brasileiro: “algumas palavras me ferem o ouvido, como, por exemplo, democracia. Onde existe o estado democrático de direito? Para quem existe?”

O sacerdote comentou as ameaças que tem sofrido por sua atuação social e destacou que foi processado por Bolsonaro em 2017, por tê-lo qualificado como “racista, machista e homofóbico” durante uma celebração religiosa.

Diante das sinalizações do presidente eleito sobre sua intenção de tipificar movimentos como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) como organizações terroristas, denunciou que o ódio praticado por Bolsonaro e seus seguidores já é sentido pela população em situação de rua: “a Polícia Militar e a Guarda Civil Metropolitana está dizendo todos os dias aos moradores de rua que eles serão exterminados a partir do dia primeiro de janeiro”.

“Uma vez me perguntaram: padre, de que ordem o senhor é? E eu respondi: eu sou da desordem. A ordem é a repressão, é a covardia, é calar a voz dos que querem se manifestar. Nós temos que exercitar o nosso amor político pelos insignificantes, pelos esquecidos. E nesse momento é importante que tenhamos a coragem da insubordinação, da desobediência civil”, concluiu.

 

 

Por Leonardo Fernandes

Fonte: Brasil de Fato