Feminicídio e a política machista do Governo Bolsonaro
Com 21 dias de governo Bolsonaro, já haviam sido registrados cento e sete casos de tentativa de feminicídio no país. Desses, 68 casos foram consumados e 39 tentativas, com registros em pelo menos 94 cidades, distribuídas por 21 estados do país, média de cinco ocorrências por dia. Os dados são de um levantamento realizado pelo professor Jefferson Nascimento, doutor em Direito Internacional pela USP, com base no noticiário nacional.
Segundo Érica Fontana Sampaio, coordenadora estadual do MTST, esse já é um claro reflexo da política de governo do atual presidente da República Jair Bolsonaro:
“Existe um simbolismo de retrocessos nessa eleição. O fato dele ser o presidente do Brasil fortalece o discurso antifeminista, machista, misógino, que foi o discurso realizado pelo candidato em toda a sua carreira pública, inclusive durante o pleito eleitoral”, afirma.
Além disso, medidas como a assinatura do decreto que facilita a posse de armas, assinado em 15 de janeiro pelo atual presidente, facilitam situações que resultam em feminicídio.
“A maioria dos casos acontece dentro de casa e é protagonizada pelo próprio parceiro da vítima. Então, facilitar a posse de arma nas casas brasileiras vai implicar em maior número de feminicídio. Isso atinge de frente todo o acúmulo e avanço que tivemos na luta das mulheres nos últimos anos”.
Ativista da Ocupação Tereza de Benguela, ocupação de mulheres localizada na Zona Leste de São Paulo, que realiza atividades de promoção da saúde e bem-estar, Érika também destaca que 80% das mulheres que fazem parte do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto já sofreram algum tipo de violência, seja verbal, física ou emocional.
“O feminicídio não acontece de uma maneira imprevisível e única, é resultado de muitos abusos prévios. Às vezes, a mulher vem sendo violentada por anos e mais cedo ou mais tarde, culmina no absurdo do feminicídio, ou seja, é um crime previsível e prevenível.
Outra face grave do assunto, e que precisa ser combatida, é a subnotificação dos casos de violência, consequência do despreparo da delegacia da mulher para receberem as vítimas de violência doméstica.
“Quando essas mulheres procuram uma delegacia da mulher, sofrem uma segunda violência, pois muitas são culpabilizadas pelo que sofreram. Além disso, as delegacias não funcionam aos finais de semana, nem a noite, período onde a maior parte dos casos acontece”.
OcupaçãoTereza de Benguela como resistência aos retrocessos de Bolsonaro
No dia 25 de novembro de 2017, em homenagem ao Dia Internacional para a não-violência Contra as Mulheres, o MTST realizou a primeira ocupação de mulheres, na Zona Leste de São Paulo, na região da José Bonifácio. Foi ocupado um espaço público com o intuito de denunciar a violência contra as mulheres e a falta de aparelhos públicos que deem suporte para essa camada da sociedade.
“As mulheres, que são vítimas de violência, precisam de um abrigo e de espaço de acolhimento porque, às vezes, voltar pra sua casa significa estar exposta à sucessivas violências que vão culminar no feminicídio”, explica Érica.
A militante do MTST e coordenadora da Ocupação Tereza de Benguela, Luciana, reforça a importância do local como ponto de acolhimento, apoio e empoderamento de mulheres que passaram por situação de vulnerabilidade e vitimadas pelo abuso do companheiro:
“Ser mulher no MTST é um aprendizado sobre força e coragem. Mulher bonita é a mulher que luta e isso, dentro da Tereza de Benguela é uma realidade. Nas periferias é muito comum a supervalorização do homem e a falta de sororidade quando uma mulher sofre uma violência. A gente aprende que é preciso se colocar no lugar da outra, fazer a escuta mais humana e estar disposta a ajudar. Somar forças. Assim, nasce o acolhimento e o empoderamento para se libertarem da situação de violência”.
Na Tereza de Benguela, desde o seu início, promove atividades de saúde e bem-estar, inúmeras rodas de conversa de mulheres e de homens sobre feminismo, além de vídeo-debates e oficinas de empoderamento econômico para as mulheres. Também foi realizado um chá de bebê coletivo com cerca de 70 gestantes.
Cláudia, também coordenadora da ocupação de mulheres, aborda tais ações em sua afirmação:
“Todas as atividades realizadas possuem uma reavaliação e buscam enriquecer as discussões entre homens e mulheres sobre os papéis de gênero, as imposições do patriarcado. Também busca-se a ampliação do conhecimento dos direitos feministas, das lutas transversais que dialogam com a reforma urbana porque são mulheres que não possuem vagas para seus filhos, por exemplo. É a realização de formações políticas e de oficinas que possibilitam um olhar de autonomia e geração de renda, saindo da submissão econômica. É um caminho de descoberta e luta constante. É aprendizado”.
Sob esse cenário de tantos retrocessos e de violência contra as mulheres, a ocupação Tereza de Benguela se mostra mais do que apresentar um espaço de empoderamento individual. É uma ferramenta para se pensar o feminismo popular, comunitário e periférico, na luta contra o machismo do governo Bolsonaro. O MTST busca a libertação de toda a classe trabalhadora e das mulheres periféricas como processo de reforma urbana e sobretudo, social.