Temer prefere atender a elite financeira a adotar medidas eficazes contra desemprego
Fonte: The Intercept Brasil
Por Helena Borges –
A GRAVIDADE DA SITUAÇÃO financeira do Brasil se escancara com o latente desemprego do país. O governo poderia tomar medidas assertivas para mudar o quadro de forma mais rápida? Até poderia, mas não vai fazer. Essa foi a resposta de diversos especialistas consultados por The Intercept Brasil.
São dois os motivos da inércia. O primeiro: políticas mais enfáticas iriam contra a ideologia neoliberal que atualmente impera, a famosa lógica de que “o mercado se autorregula”. O segundo, e principal motivo: porque isso não interessa à elite financeira.
“É um novo discurso, é um novo governo…”
…disse Henrique Meirelles, em junho de 2016, pouco depois de sua posse como ministro da Fazenda. Em reunião com empresários, ele afirmou que os investidores estavam voltando ao país. De fato, o dinheiro está entrando. O número de investidores cadastrados pelo Tesouro Nacional tem quebrado recordes desde o primeiro mês do governo Temer, chegando a quase 402 mil. A questão é para onde todo esse dinheiro — R$ 41,1 bilhões apenas em 2016 — está indo.
Ao leitor desabituado às colunas econômicas, não se assuste ao perceber se este dinheiro não estiver:
1 _ Indo para sua conta corrente
2_ Fazendo a economia girar
3_ Produzindo empregos
[Inclusive, em janeiro o IBGE divulgou um novo recorde de desempregados, agora são 12,3 milhões de pessoas desocupadas no Brasil.]
Por onde andam esses R$41bi?
Seguindo a lógica da economia, aumento em investimentos deveria significar aumento em vagas de emprego, porque quem investe coloca seu dinheiro em empresas e em inovação, iniciativas que darão lucro. O problema no Brasil é que essa não tem sido a finalidade dos investimentos feitos, porque há uma questão simples de conceito econômico: eles não são investimentos, são aplicações. O economista Fábio Terra, professor da Universidade Federal de Uberlândia, explica:
“Existe uma diferença entre investimento produtivo e investimento financeiro [mais conhecido como aplicação, como a de uma poupança]. Esse dinheiro simplesmente não vai parar no mundo real da economia. Ele pode ficar apenas na esfera financeira, na troca de mãos. O investidor vai tentar ganhar com a variação dos preços das dívidas e ações; ou com a valorização do câmbio; ou com o diferencial de juros, que no Brasil são muito altos.”
Segundo o professor, existe um “sufocamento de crédito” para médias e microempresas, o que explica a persistente crise de desemprego no país. O interesse dos investidores está em financiar o governo por meio de títulos públicos, porque isso faz seu dinheiro render mais e com mais segurança.
Se o dinheiro não chega para os pequenos e médios empresários, estes, por sua vez, não podem manter seus negócios e, por isso, não podem contratar. “Em grande medida, o que os atrai são os juros altos mantidos pelo Banco Central”, conta Terra.
O que são os títulos públicos e o que eles têm a ver com o desemprego?
Se, para o trabalhador assalariado, o termo “juros altos” significa contas mais caras para pagar, para quem investe significa mais dinheiro a receber. Os juros são a base de cálculo do rendimento dos títulos públicos. A Agência Brasil explica como os títulos funcionam:
“A venda de títulos é uma das formas que o governo tem de captar recursos para pagar dívidas e honrar compromissos. Em troca, o Tesouro Nacional se compromete a devolver o valor com um adicional que pode variar de acordo com a Selic, índices de inflação, câmbio ou uma taxa definida antecipadamente no caso dos papéis prefixados.”
[ênfase adicionado]
A taxa Selic, um dos parâmetros de cálculo citados acima, é estipulada pelo Banco Central. Ela chegou a valer 14,15% ao ano em julho de 2015, durante a gestão Dilma, e lá permaneceu até outubro de 2016, já na gestão Temer. Hoje encontra-se em 12,90% ao ano.
Isso coloca o Brasil em primeiro lugar no ranking mundial de países que mais pagam juros reais (aqueles que descontam a inflação) aos seus credores. Quando o cálculo é em juros nominais, o país fica em terceiro lugar. O relatório assinado pela gestora Infinity Asset mostra que, dos 40 países ranqueados, apenas quatro mantêm juros nominais acima de 10%: Argentina, Venezuela, Brasil e Rússia. A média geral paga pelos bancos centrais aos seus investidores é 3,32%, e há 13 países que mantêm juros em zero ou abaixo de zero.
Foto destaque: AFP/Getty Images