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MTST lança Centro Popular de Pesquisa: por uma ciência popular e descolonizadora

21 de julho de 2024

Iniciativa que tem como objetivo produzir conhecimento para construir soluções para problemas periféricos apresentou os resultados de pesquisa de perfil realizada na região Norte de São Paulo

 

Apresentado ao público no último dia 12, o Centro Popular de Pesquisa (CPP) reúne pesquisadores, acadêmicos e moradores dos territórios ocupados pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), promovendo estudos, mapeamentos e análises que refletem as vivências e resistências populares. Com uma abordagem profundamente enraizada na realidade latino-americana, o CPP surge como um espaço essencial para compreender e transformar a realidade das comunidades onde o movimento está presente. 

O lançamento do CPP foi celebrado no centro de São Paulo com a presença de Ana Paula Perles, coordenadora nacional do MTST, e da deputada estadual Ediane Maria, além da militância de São Paulo, especialmente a base da Ocupação Nova Canudos, que foi objeto de uma pesquisa de perfil sócio-econômico com integrantes do movimento, realizada pelo CPP. Tomaz Henrique da Costa Ribeiro e Grindelia Del Valle Pinzo, integrantes do CPP, não conseguiram participar presencialmente do evento, mas prestigiaram o lançamento através de vídeos enviados para apresentação ao público. 

Mony Cruz, coordenadora estadual do MTST, abriu o evento celebrando o lançamento do CPP. “Chique demais, né, gente? Olha só onde o povo sem-teto chegou: Centro Popular de Pesquisa!”. Ela iniciou a apresentação dos resultados da pesquisa com um número expressivo: na região Norte de São Paulo, 60% das militantes são mulheres. O  MTST é constituído majoritariamente por mulheres e a pesquisa do CPP “traduz” essa informação em indicadores sistematizados por meio de pesquisa. 

A importância do CPP como um instrumento de produção de conhecimento ancorado nas vivências das comunidades urbanas foi ressaltada na fala de Hélio Alexandre da Silva, integrante do CPP e das Relações Internacionais do MTST. Segundo ele, “o conhecimento é importante demais para ser monopolizado por instituições acadêmicas”, por isso, “é  preciso investir em pesquisas realizadas por quem faz parte da realidade cotidiana de movimentos sociais, como o MTST”.

No entanto, ele insiste que o CPP não pretende competir com o conhecimento produzido nas universidades, mas contribuir com sua democratização através de um trabalho orientado pelas demandas vindas dos territórios em que o MTST está organizado em todo o Brasil. O CPP também atua em Recife, onde realizou a mesma pesquisa de perfil socioeconômico.

Hélio ressaltou ainda a importância da pesquisa de perfil realizada na região Norte de São Paulo como uma experiência de investigação dos principais obstáculos que impedem que as pessoas que moram nas periferias urbanas tenham uma vida digna, como o acesso precário ao transporte público. “Precisamos saber se tem ônibus perto de onde moramos, se esses ônibus passam lotados ou vazios, e se possuem ar-condicionado nos dias quentes. É fundamental entender esses aspectos para melhorar a qualidade de vida nas periferias.”

O integrante do CPP e um dos responsáveis pela pesquisa destacou a importância do autoconhecimento do movimento, defendendo que, ao entender nossas próprias dinâmicas, podemos identificar o que precisamos melhorar e o que devemos manter para fortalecer nosso movimento, e compartilhou mais alguns dados relevantes: “A pesquisa revelou que 60% dos membros do MTST na região Norte de São Paulo são originários do Nordeste do Brasil, com destaque para estados como Bahia e Pernambuco”

Ele também ressaltou a contribuição internacional dentro do movimento, frissando que na região Norte 10% da militância é composta por estrangeiros vindos de países como Bolívia, Peru, Haiti e Paraguai. “Isso mostra a pluralidade do MTST e como ele está de portas abertas para todos que desejam lutar por uma vida melhor para o povo pobre das periferias urbanas”. 

Hélio finalizou sua participação contando sobre a busca do CPP em construir conhecimento de forma inclusiva e do objetivo de integrar tanto pessoas com formação acadêmica, quanto aquelas que não tiveram essa oportunidade. “O CPP pretende construir conhecimento com o povo e para o povo, promovendo uma relação profunda entre aqueles que tiveram a oportunidade de adquirir formação acadêmica nas universidades e aqueles que não tiveram esse acesso. Essa diversidade é uma das nossas maiores riquezas e é fundamental para nossa construção coletiva.”

 

Rud Rafael, coordenador nacional do MTST e integrante do CPP, reforçou essa visão ao destacar como o movimento tem historicamente subvertido as tentativas de criminalização e marginalização das suas ações. “Enquanto alguns na Câmara de Vereadores querem criminalizar a distribuição de alimentos, nós vamos lá e fazemos um marmitaço, desmoralizando essa lógica de pensamento e produzindo uma nova lógica de pensar a sociedade.”

O coordenador nacional sublinhou a importância do CPP como uma ferramenta de longa duração para o movimento, comparando-o a iniciativas passadas que ajudaram a moldar o pensamento crítico do MTST. “Daqui a uma década, veremos o impacto real desta ferramenta na produção e fortalecimento das resistências e processos revolucionários.”

Ele compartilhou uma visão esperançosa para o futuro do CPP: “O Centro Popular de Pesquisa ajudará a sistematizar o conhecimento produzido diariamente pelos nossos militantes, superando a invisibilidade histórica à qual nossos corpos foram relegados. Vida longa ao Centro Popular de Pesquisa, que hoje seja um dia histórico de comemoração e também de visualização de novos horizontes para nossa luta revolucionária, não só no Brasil, mas na América Latina e no mundo.”

Ana Paula Perles, coordenadora nacional do MTST, ressaltou a importância da pesquisa para a construção de políticas do movimento: “Será que é verdade que o movimento é composto, em sua maioria, por mulheres? Será que é verdade que o movimento é de maioria de negros e negras? Agora temos um Centro de Pesquisa para sistematizar essas informações e melhorar nossas políticas externas e internas.”

Ana encerrou sua fala declamando Aula de Vôo, um poema de Mauro Iasi que explora a trajetória do conhecimento através da metáfora da metamorfose da lagarta à borboleta e que representa muito bem a visão do MTST no processo de construção do CPP: o conhecimento verdadeiro é dinâmico, fluído e consciente de suas próprias limitações e transformações. É um processo contínuo de metamorfose, onde tanto o casulo quanto a asa são essenciais para alcançar novos patamares de entendimento e sabedoria.

“Acho que aqui depois desses dados, que mostram um MTST feito de mulheres, de pessoas negras, de pessoas do Nordeste e da América Latina, podemos dizer com toda certeza que temos uma nação MTST, com muitos povos, com muitas cores, com muitas dores, mas muitas alegrias também. Então, vida longa ao CPP, vida longa ao MTST, vida longa aos seus militantes que constróem o maior movimento social urbano da América Latina!”, concluiu a dirigente. 

 

Convidados destacam importância do CPP

 

Ediane Maria, deputada estadual de São Paulo e primeira sem-teto da Alesp, falou sobre a importância de pesquisas, como a realizada pelo CPP, para a formulação de políticas públicas. “Essa pesquisa traz o olhar do povo falando o que quer para o seu bairro. Entender a realidade das periferias e das ocupações é fundamental para transformar a realidade de forma revolucionária.”

 

Bélgica Del Carmen Saez, integrante do CPP e coordenadora da ocupação Elza Soares, localizada na Zona Leste de São Paulo, destacou o impacto pessoal da militância em sua vida enquanto imigrante venezuelana. “Eu cheguei na Elza Soares (ocupação que fica na zona leste) buscando moradia e hoje estou aqui, minha vida mudou completamente. Fui acolhida, e recebida com muito amor e carinho e é uma satisfação muito grande hoje construir também o CPP”. 

Ela também falou sobre a importância da construção de conhecimento popular. “Quem falou que nós não produzimos conhecimento, que nós não pensamos? Pensamos, e muito! Fazer pesquisa popular significa ser pesquisadora do povo e para o povo. Sentir e conhecer as necessidades do nosso povo.”

 

Alberto Fierro, integrante do CPP e das Relações Internacionais do MTST, reforçou a importância da produção de conhecimento a partir das experiências vividas pelos militantes. “Produzir conhecimento é uma necessidade para o MTST. Não podemos depender apenas de pesquisas acadêmicas que muitas vezes não refletem a realidade das nossas comunidades. Nós, que estamos no dia a dia das ocupações, temos um olhar único e essencial sobre as dificuldades e as soluções possíveis. A criação do CPP é uma resposta a essa necessidade de termos dados e análises que realmente nos representem e nos ajudem a fortalecer nossa luta.”

 

Marcelus Annus, imigrante haitiano, integrante do CPP e coordenador da ocupação Lélia Gonzalez, em Santo André (SP), compartilhou sua jornada de aprendizado e envolvimento no movimento e enfatizou a importância do CPP para a construção coletiva do conhecimento e a valorização da sabedoria popular. “O CPP é um espaço para valorizar o conhecimento que vem da nossa vivência e luta diária. Quando fui convidado a fazer parte do Centro de Pesquisa, fiquei surpreso, mas entendi rapidamente que nossa experiência de vida é uma fonte rica de informações. No MTST, aprendemos uns com os outros e com nossas comunidades. O CPP nos permite sistematizar esse aprendizado e transformá-lo em ferramentas poderosas para nossa luta por direitos.”

 

Lívia Garcia, integrante da organização da região Norte de São Paulo, ressaltou a importância da formação e da inclusão de quem compõe a base do MTST nas ações do movimento. “No CPP, buscamos não apenas entender as necessidades do nosso povo, mas também oferecer capacitação para que cada pessoa seja protagonista na luta por seus direitos. Conhecimento é poder, e queremos que esse poder esteja nas mãos de quem mais precisa.”

O evento de lançamento do CPP foi um marco significativo para o MTST, simbolizando um passo importante na construção de um conhecimento verdadeiramente popular e inclusivo, que reflete as realidades e aspirações das comunidades marginalizadas. Este marco representa mais do que um avanço na pesquisa; ele é um passo fundamental na luta por justiça social. Com o CPP, o MTST reafirma sua dedicação em construir um futuro mais equitativo e uma vida mais digna para a população que vive nas periferias urbanas.

Veja alguns momentos: